quarta-feira, 12 de junho de 2013

CRIATIVIDADE E APRENDIZAGEM
NEUROEDUCAÇÃO


A criatividade como parte do desenvolvimento psicológico é um processo que
acompanha o ser humano em toda a sua existência.
Este estudo tem como meta principal destacar o papel da criatividade na constituição do sujeito criança e/ou adolescente, particularmente no contexto da educação básica, questionando o lugar da escola na estimulação do potencial criativo de alunos e alunas, mediante ações desencadeadoras do desejo de experimentar e fazer coisas diferentes e criativas.
Num primeiro momento parece-nos estranho pensar que a criatividade tem um papel muito importante no exercício da aprendizagem. Mas, na verdade, o pensamento criativo ajuda no ato de aprender, muito em especial nas crianças.
Tendo por base teórica a perspectiva contextual-interacionista, destaca-se o papel da criatividade na constituição do sujeito, mediante ações desencadeadoras do desejo de aprender, experimentar, fazer coisas diferentes e criativas, apontando o grande desafio a ser superado.
E, assim, a criatividade torna-se num imperativo de “aprender a ser” como também de “aprender a conviver” com pessoas, contextos e novos saberes de forma interativa, dinâmica e criativa.
Segundo Goethe, “A ação criadora orienta o homem, proporcionando continuidade à sua existência”.
Nos últimos 150 anos, o desenvolvimento da criança foi pensado sob seus diferentes aspectos: físico, emocional, cognitivo, social, atendendo a modelos epistemológicos, por vezes, divergentes entre si, a exemplo da filosofia e da ciência.
Alguns filósofos, já nos séculos XVII e XVIII, debruçaram-se sob questões acerca da natureza humana, sua gênese e evolução. Locke e Hume, empiristas britânicos entendiam que a mente humana constitui-se como um quadro em branco, uma tábula rasa, sendo a experiência e o contato com o meio determinantes do conteúdo psíquico. Nessa linha de raciocínio a história psíquica da criança é a história de suas aprendizagens.
Por outro lado, Rosseau e Kant defenderam a existência de características inatas do ser humano. O primeiro, destaca a bondade natural da criança e uma concepção de infância dividida em estágios, cada um dos quais apresentando características próprias, exigindo tratamento educacional diferenciado; o segundo dá destaque às
categorias inatas do pensamento, considerando a razão dotada de um poder superior e a priori de conhecer.
A tentativa de identificar os diferentes fatores determinantes no complexo processo de desenvolvimento humano permite que, na atualidade, o desenvolvimento psicológico seja entendido como um processo complexo multi-determinado e multi-orientado que considera o contexto bio-psicosocial-cultural a partir de perspectivas e enfoques teóricos diversificados, valorizando o que há de mais relevante em cada proposta.
Numa perspectiva contextualista-interacionista, conforme Palácios, (1995, p.22), “o desenvolvimento infantil é em grande parte a representação interna de
relações interpessoais estáveis que a criança mantém com o meio”, o que não significa dizer que tudo seja reduzido aos processos de aprendizagem, desconsiderando, tampouco, os limites e as possibilidades advindas dos processos de maturação neurofisiológica, muito menos os fatores histórico-culturais nele implicados. Essa flexibilidade permite considerar a ação dos diferentes contextos educacionais (família, escola, comunidade, cultura) sobre o desenvolvimento da criança e do adolescente de forma dinâmica e recíproca, considerando que crianças, adolescentes e contextos transformam-se conjunta e mutuamente.
A cada idade estabelece-se um tipo particular de interações entre o sujeito e o seu ambiente. Os aspectos físicos do espaço, as pessoas próximas, a linguagem e os conhecimentos próprios a cada cultura formam o contexto do desenvolvimento.
A reciprocidade existente entre a conduta da criança e os recursos do ambiente
vai consolidando a aquisição das funções psicológicas superiores (inteligência
simbólica, memorização, consciência, raciocínio dedutivo, pensamento abstrato),
alimentadas pela linguagem e pela cultura.
Trazer o foco de entendimento do processo ou fenômeno psicológico para a relação estabelecida num contexto sócio-cultural possibilita um trabalho de síntese, integrando a criança e o adolescente como corpo e mente, ser biológico e social, membro de uma espécie e participante de um contexto histórico.
Vygotsky também considera que desenvolvimento humano e educação, constituem-se nos dois lados da mesma moeda. É pela educação, através da mediação social, que o indivíduo internaliza a cultura e se constitui humano, desenvolvendo-se de forma dinâmica (dialética), através de rupturas e desequilíbrios provocadores de contínuas reorganizações internas, fundamentais para a expressão do potencial criativo.
Dizer que uma relação é mediada é romper com um modelo linear que predomina no desenvolvimento da ciência psicológica, é afirmar que essa relação estará sempre aberta e em construção, considerando a condição de atribuir significado e construir o conhecimento que o sujeito passa a ter. Ainda para Vygotsky os fatores relacionais assumem um papel de protagonista no processo de construção do conhecimento, tendo a palavra uma grande função enquanto elemento mediador. Para ele, esse processo dá-se tendo por base o cenário ou contexto histórico em que ocorre, não podendo ser reduzido às impressões individuais do sujeito.
Assim, mediar o processo de construção do conhecimento e a aprendizagem no
contexto escolar acaba por ser o grande desafio para o educador/educadora da educação básica.
[...] Se temos um aprendiz que é inteiro, pluridimensional e uma tarefa
educacional que possibilita a interação deste aprendiz com o
conhecimento historicamente construído, para incentivar novas
construções e novos saberes, necessitamos conceber os alunos e alunas
do atual momento histórico como sujeitos capazes de agir sobre o
mundo. Além disso, capazes de permitir que a ação do mundo sobre si
próprios, para que se possa desenvolver como seres humanos, com
disponibilidade para conhecer e transformar o conhecimento, utilizandoo
como instrumento de transformação da realidade. (BARBOSA, 2006,
P.17)
Tal posicionamento requer uma postura mais ativa e atenta do docente frente a
um aprendiz potencialmente capaz e criativo. Essa é uma perspectiva de pensar a
construção do processo criativo atrelada a uma concepção de educação e de ensino que concebe a criança e o adolescente como um sujeito aprendiz pleno de possibilidades e responsabilidades consigo mesmo e com o contexto sócio-histórico no qual estão inseridos.
Para educadores/educadoras uma questão significativa é: como potencializar no
aprendiz a sua criatividade? O que considerar na organização das atividades escolares
propostas para a educação básica?
Segundo Torre (2005), algumas teorias filosóficas, consideradas pré-científicas, atribuíam o processo criativo à ação de forças que escapavam ao controle da vontade do indivíduo, caracterizando-se como loucura, excentricidade, intuição genial, ou ainda como um atributo hereditário ou mesmo divino. Projetava-se assim a criatividade como sendo um talento excepcional apresentado por pessoas também excepcionais, detentoras de uma competência que a caracterizava como diferente, por vezes superior, seja na condição de gênio, louco ou artista.
A tentativa de compreensão do fenômeno criativo numa perspectiva mais
científica aponta para a sua compreensão sob um enfoque mais psicológico remetendo-o a comportamentos e aprendizagens, a processos de conhecimento que atendem a perspectivas afetivas e atitudinais constitutivas de um sujeito imerso na rede de relações sócio-culturais e históricas.
Embora em todo ser humano haja potencial para gerar novas idéias, em algumas pessoas, esta qualidade se destaca por cima de outras, como a inteligência, a sociabilidade, a percepção, a comunicabilidade, a concentração, a empatia, a memória e outras, que podem ser aumentadas mediante a prática ou a educação.
O que nos sugere que a existência de um espírito criativo, longe de reduzir-se a
aspectos imanentes, hereditários ou até místico-religioso, fruto de uma vocação especial ou dom divino, tem como fundamento o domínio de códigos específicos cuja
apropriação potencializa a expressão de idéias e/ou materialização de um ato. O
somatório entre talento, potencial cognitivo e capacidade de criação deve agregar, ainda, o reconhecimento num dado contexto que acolhe e nomeia algo como sendo inovador, excepcional.
A criatividade remete-nos para a consciência de singularidade no ser humano,
constituindo-se uma qualidade de vida. Diz do modo como cada pessoa percebe a sua
realidade e nela se expressa, fazendo escolhas, estabelecendo relações, descobrindo suas possibilidades de ser e agir.
Dentro desta perspectiva, a criatividade está inserida tanto no quotidiano, ao
mesmo tempo que dele emerge, como nas relações interpessoais, no fazer diário do
trabalho escolar, em busca de novas alternativas, de novos desafios. Desse modo pode ser entendida tanto como um ato ou ação espontânea, um processo multideterminado e um modo de expressão no ambiente, constituindo-se, por vezes, numa (do)ação para o coletivo Ser criativo implica lançar mão de subsídios inerentes ao ser humano, ou mesmo desenvolvidos pela ação de estímulos ambientais, sinalizando o esforço sensível, inteligente e enriquecedor, na condução do viver a própria história em seu tempo e contexto.
A criatividade tem também a vantagem de se socializar! Segundo Saturnino de la Torre, “ela deixa de ser um dom, uma capacidade pessoal para se converter num bem social, uma riqueza coletiva. [...] a criatividade está em saber utilizar a informação disponível, em tomar decisões, em ir mais além do que foi aprendido, sobretudo, em saber aproveitar qualquer estímulo do meio para gerar alternativas na solução
de problemas e na busca de qualidade de vida”.
A escola, enquanto contexto educacional configura-se como espaço privilegiado
em que são transmitidos valores, princípios e padrões de comportamento que se espera dos membros de uma dada cultura, onde são construídos e internalizados os conceitos quotidianos e científicos.
A construção do saber na criança não ocorre pelo simples registro de informações a
respeito do mundo, mas pelo significado dado a essas informações. O saber sendo uma construção social é um fenômeno da linguagem que extrapola o campo da simples observação e percepção.
Desse modo, é duplo o desafio à educação formal: levar crianças e adolescentes a
penetrar no mundo da linguagem e fazer da prática pedagógica um lugar da palavra,
onde possam falar, pois é pela circulação da palavra que a significação se constitui. O
saber é palavra e é também ação. Palavra e ação que se expressam e se representam de forma criativa à medida que o saber vai sendo internalizado de forma tácita, integrada à subjetividade do ator social, aqui representado pela criança ou adolescente.
Assim, é preciso que o aprendiz possa viver experiências, faça várias combinações e conexões entre elas, para que se constitua um sujeito capaz de aprender utilizando suas possibilidades imitativas e criativas, capaz de representá-las através de várias linguagens e capaz de compreender, também, através de várias linguagens, a experiência e a vivência do outro, para incorporá-las à sua quando se sentir fascinado por ela.
Na visão de Howard Gardner, “a inteligência da pessoa fornece a base para a criatividade; ela será mais criativa nos campos em que tiver mais energia”, sugerindo que se o educador/educadora partir de uma área significativa de interesse do aprendiz, em muito a dimensão da aprendizagem será favorecida. Ciente dessa relação, o referido autor aponta vários campos em que as inteligências se apresentam, destacando que cada uma, com suas modalidades de expressão, é produto da interação sujeito-ambiente, na estimulação e trocas permanentes
entre um e outro: Linguagem, Matemática e Lógica, Música, Raciocínio Espacial,
Movimento, Inteligência Interpessoal, Inteligência Intrapessoal, etc.

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